Sociologia material para o ensino médio: Conceituando “raça”, “etnia” e “racismo”
Raça ou etnia?
É muito comum o emprego do termo “raça” para tratar da diversidade
humana de acordo com seus tons de pele (brancos, negros, indígenas,
asiáticos…), entretanto, no sentido biológico não existem raças humanas – somos
todos da mesma espécie que surgiu há cerca de 350 mil anos na região leste da
África, o homo sapiens. As variações de tom de pele e fisionomia correspondem
às diferenças de fenótipo que pouco ou nada tem a ver com uma suposta divisão
biológica e natural entre seres humanos. Assim sendo, porque ainda falamos em
“raça”? Devíamos abandonar o termo?
A ideia de “raças humanas”, a despeito de não ter veracidade biológica,
foi criada e usada para dividir os seres humanos de acordo com uma hierarquia
que ainda hoje influencia o modo em que vivemos. Nessa hierarquia, criada pelo
racismo científico corrente no final do século XIX até a primeira metade do
século XX, a raça branca teria uma superioridade moral, cultural, política e
econômica em relação às demais raças, sendo a raça negra a que estaria
supostamente no mais baixo nível evolutivo possível, fator que justificava a
escravidão e o domínio do continente africano por colonizadores europeus.
Sabemos hoje que a classificação das raças humanas é reflexo de um mundo
eurocêntrico que buscava legitimidade para seus empreendimentos desumanos, e
que nada tem a ver com a realidade biológica e científica, porém, a ideia
criada para justificar a submissão de um povo em relação a outro estruturou a
sociedade tal qual a conhecemos e influenciou políticas e ações
discriminatórias que ajudam a compreender diversos fenômenos dessas sociedades
na atualidade. Nesse sentido, as “raças” permanecem como categorias de análise
pelo seu valor político e social, não pelo seu valor biológico. Portanto, é
possível afirmar que, o racismo, é um sistema hierárquico artificial que
legitima o direito e a superioridade de uma raça em relação à outra.
Um dos fatores que comprovam o caráter social e político presente nos
termos “raça” e “racismo” é o fato de que o racismo opera de modos diferentes
em cada parte do mundo, se relacionando com a história e as dinâmicas
particulares da localidade. O racismo contra os negros brasileiros é muito
diferente do racismo vivenciado pelos negros sul-africanos, assim como a
hierarquia racial norte-americana é diferente das citadas anteriormente. As
hierarquias raciais não são, portanto, um bloco essencialista, se alterando e
se adaptando às realidades históricas e sociais de cada sociedade, fator que
faz com que, o racismo, seja diferente em cada região.
Já “etnia” é uma palavra que se refere a um agrupamento de indivíduos
que compartilham do mesmo sistema sociocultural, mesma língua e/ou região
geográfica. Também não se trata de uma divisão puramente biológica entre os
seres humanos, mas de uma divisão socialmente situada e compartilhada. Dizemos,
por exemplo, que o continente africano é majoritariamente habitado por pessoas
da raça negra ou que os negros africanos foram escravizados e trazidos para
trabalhar nas Américas como se “africanos” fossem um grupo homogêneo de pessoas
similares quando, na verdade, a estimativa é que existem hoje mais de 100
etnias na África, cada uma com sua cultura e línguas próprias.
Mesmo os africanos escravizados e trazidos para o Brasil para o trabalho
forçado, no comércio atlântico, não eram totalmente semelhantes em cultura,
costumes, língua e região, tendo sido trazidas pessoas de etnias diversas como
os bantu, iorubás, fon, mandingas, fantis, ashantis, hauçás, igbos, fulas e
outras. A Europa também funciona do mesmo modo: o que convencionamos chamar de
“europeus” trata-se de um conjunto diverso de etnias culturais, geográfica e
linguisticamente localizadas, como os bálticos, albaneses, escandinavos,
galeses, sérvios, russos, armênios, romenos, bascos e assim por diante.
Se não existem raças humanas, deveríamos então trocar o termo “raça
negra” por “etnia negra”? Algumas pessoas têm proposto essa suposta solução
para o tema, entretanto, não existe uma unidade entre os povos negros, além da
cor da pele, que justifique o uso do termo “etnia negra” – o negro
norte-americano possui uma cultura, língua e costumes diferentes do negro
brasileiro ou do negro nigeriano que, por sua vez, se divide entre diversas
etnias, por exemplo – além de que uma troca de termos não resolveria a questão
da hierarquia que organiza a sociedade independente de abandonarmos ou não o
termo “raça”.
Raças humanas não existem, mas a divisão artificial da população em
raças continua trazendo consequências que precisam ser entendidas e explicadas
para assim serem combatidas. Consequentemente, manter o uso do termo “raça”
torna-se válido quando analisamos a questão do racismo para além da biologia, o
compreendendo como fator político e sociológico.
Racismo nos Estados Unidos e no Brasil
Brasil |
EUA |
|
Semelhanças |
– Países
com passado escravista; – Nações
com grande volume de negros escravizados; – Adoção
de políticas racistas nos pós abolição; – Possuem
racismo estrutural; – Permitem
a autodeclaração racial; |
|
Diferenças |
– Política
pró-miscigenação; – Embranquecimento
do país; – Imigração
– importação de imigrantes da Europa e Ásia; – Nunca
houve proibição formal de relações inter-raciais; – Preconceito
se dá pelo fenótipo; – Acreditavam
que em 100 anos não existiriam mais negros no país; – Preconceito
de marca; – Mito
da democracia racial; – Pessoas
com a pele mais escura sofrem mais preconceito do que as pessoas de pele mais
clara; |
– Política
de segregação; – Proibição
de casamentos inter-raciais; – Regra
da gota única; – Preconceito
se dá pela hereditariedade – genótipo; – Pessoas
lidas como brancas não desfrutam do mesmo privilégio que os brancos; – Preconceito
de origem; |
A morte de João Pedro,
14 anos, dentro de casa é uma dessas injustiças. A morte de George Floyd, 46
anos, em uma abordagem policial é outra injustiça. No Brasil, o país em que
mais pessoas morrem assassinadas, o fato de 77% dos jovens assassinados serem
negros é a maior dessas injustiças e a prova de que estamos falhando como
sociedade.
Cada vida negra que se perde, graças ao racismo que
naturalizamos, é uma injustiça que nunca conseguiremos reparar.
Por este motivo eu tomei a liberdade de escrever, porque é meu dever lutar
contra isso. E para lutar, precisamos falar e combater o racismo estrutural.
Mas para falarmos sobre
racismo estrutural, precisamos primeiro definir o que é racismo.
O que é
racismo
Segundo o dicionário
Priberam de Língua Portuguesa, racismo é uma “teoria
que defende a superioridade de um grupo sobre outros, baseada num conceito de
raça, preconizando, particularmente, a separação destes dentro de um país
(segregação racial) ou mesmo visando o extermínio de uma minoria”.
O verbete também fala
que trata-se de uma “atitude hostil ou discriminatória em relação a um grupo de
pessoas com características diferentes, notadamente etnia, religião, cultura
etc”.
O racismo em si se dá
pelo mal funcionamento nas instituições e por falhas no Estado. No Brasil, o
racismo passou a ser considerado crime em 1989, através da Lei
Federal 7.716, que prevê uma pena de até 5 anos de
reclusão e multa, sendo também imprescritível e inafiançável.
Infelizmente, nosso
país foi construído com base escravocrata, na qual as pessoas pretas eram
mercadorias. Mesmo após a lei áurea em 1888, elas não receberam nenhum tipo de
indenização ou tiveram políticas públicas voltadas para seu bem-estar e
adequação à nova sociedade.
Proibidos de adquirir
terras, jogar capoeira, estudar, e sendo constantemente marginalizados, foram
jogados à própria sorte. Sua cultura continuou sendo atacada e vista de forma
negativa, sua religião enxergada como algo mal. Este foi o contexto do início
do racismo estrutural.
Racismo estrutural
Segundo o portal Brasil de Direitos,
racismo estrutural é a “naturalização de ações, hábitos, situações, falas e
pensamentos que já fazem parte da vida cotidiana do povo brasileiro, e que
promovem, direta ou indiretamente, a segregação ou o preconceito racial”.
Silvio Luiz de Almeida,
filósofo, jurista e professor universitário defende
que a forma como a sociedade é constituída reproduz parâmetros de discriminação
racial, no campo da política e da economia, sendo o
racismo estrutural naturalizado como parte integrante do meio social.
O professor também
destaca que o racismo é constituído por ações conscientes e inconscientes, e
que nós, enquanto sociedade, acabamos naturalizando a violência contra pessoas
negras, e que a morte de jovens negros não nos choca como deveria.
Um outro dado alarmante
sobre a sociedade no Brasil é que no ano de 2019 65% dos brasileiros desempregados era negro.
Apesar de tudo isso, um
dado me causou mais espanto ainda: 52% dos brasileiros se declara negro. Ora,
que país que discrimina mais da metade de sua população?
O racismo estrutural
pode ser notado na nossa língua, nos nossos gestos, na composição dos
Governos.
Falando
em Governo, um exemplo rápido: atualmente, o Brasil está no seu 38º Presidente
da República. Sabe quantos presidentes negros nosso país já teve? Um. Alguns
estudiosos defendem que Nilo Procópio Peçanha foi o primeiro (e até agora
único) presidente negro do Brasil. Um país que possui mais da metade de sua
população negra, só elegeu um presidente da mesma etnia. Insiro uma foto de
Peçanha abaixo, caso você não o conheça.
O
racismo estrutural é isso: a desvalorização de pessoas negras e a perpetuação
da desigualdade. É a falta de oportunidades, o preconceito, a segregação de
mais da metade da população.
Atividade
de sociologia para o 2º ano Produzir uma redação
Tendo
como base o texto Conceituando “raça”, “etnia” e “racismo”
Produza um texto
dissertativo argumentativo no mínimo 15 linhas e no máximo 30, com o seguinte tema:
“A persistência do racismo na
sociedade brasileira”
Observação: Não
existirá texto certo ou errado, irei analisar apenas o processo argumentativo
do texto que você irá escrever.
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